Imprensa

Macamo pede reconciliação da família moçambicana

22/10/2015 08:15

A Presidente da Assembleia da República, Verónica Macamo, pediu ontem aos moçambicanos, em geral, e aos políticos, em particular, para que se reconciliem, unindo as mãos e dissipando a desconfiança recíproca.

Discursando na cerimónia de abertura da II Sessão Ordinária da VIII legislatura, que ontem iniciou em Maputo, Macamo foi peremptória ao apelar a todo o povo para que negue e renegue a guerra, potenciando o que une a todos e minimizando, ao máximo, o que desune.

“Peço-vos, piamente, do fundo do coração, que em nome do povo moçambicano que nos elegeu, que tanto nos ama e confia, nos reconciliemos. Repito: nos reconciliemos!”, afirmou.

Segundo a Presidente da AR, as críticas devem ser feitas para melhorar, educar e não para humilhar ou ofender. Referiu que saber ofender não é uma virtude, mas sim um defeito que cada pessoa deve abandonar para que se possa alcançar a harmonia, a tolerância, o amor ao próximo, elementos básicos para uma convivência sã e para a manutenção de uma paz perene.

De acordo com Verónica Macamo, ao procurar concretizar estes desafios, os políticos estarão a levar a cabo um gesto apaziguador e sem retorno, como se, em conjunto, “plantássemos uma árvore do nosso futuro. Uma árvore bela, frondosa e cheia de frutos cujos nomes são felicidade e bem-estar social”.

“Dito isso, que cada um de nós vá ao seu partido político, ao seu círculo eleitoral, à sua família e amigos, à sua igreja e ao seu local de trabalho dizer: nós não queremos guerra, jamais! Vamos desarmar a nossa mente e purificar o nosso coração! Vamos ser pacíficos e procurar ser homens de virtudes! Vamos acarinhar a paz com actos concretos, como tem apelado o nosso querido Presidente da República”, recomendou a líder do mais alto órgão legislativo do país.

Verónica Macamo não terminou por aqui nos seus apelos à paz e reconciliação. Pediu para que os moçambicanos se imponham, mostrando as suas ideias, na diferença, em nome da democracia, em nome da pátria, do amor e de felicidade para o povo.

Aliás, para a Presidente da AR o país precisa de continuar a construir consensos sobre os grandes problemas nacionais. “Todavia, a predisposição para o diálogo é sempre condição sine qua non e é reveladora do espírito e da grandeza patriótica dos actores políticos”, sublinhou para depois referir que os deputados, enquanto actores políticos, devem ser o espelho dessa predisposição para o diálogo.

Alertou à necessidade de o discurso político ser reconciliatório e de promoção de paz e nunca para incentivar o recurso à violência, à guerra, à agitação de massas ou à discórdia.

“Num país democrático, o que deve contar é o debate de ideias, o respeito pela diferença de opinião e a busca de maior consenso”, enfatizou Macamo.

Num outro desenvolvimento da sua intervenção de cerca de 45 minutos, a Presidente da AR debruçou-se sobre os desafios económicos e sociais que o país tem pela frente.

Começou por se referir ao desafio da globalização, onde Moçambique tem como prioridade a integração regional na SADC, onde é chamado a ser cada vez mais proactivo e imaginativo, propondo soluções estruturantes para vários sectores de actividade.

Referiu que os grandes projectos implantados no país – sobretudo os minerais – trouxeram uma grande expectativa, o que, para ela, não basta. “Os grandes projectos são investimentos focalizados em determinadas áreas geográficas e muitos deles ainda estão na forja”, sublinhou para depois acrescentar que o que o país precisa é de continuar, estrategicamente, a promover outras iniciativas de investimento, diversificando os sectores produtivos.

Verónica Macamo chamou, igualmente, atenção para a necessidade de se apostar no investimento do capital; na criação de oportunidades de emprego, apostando em parcerias público-privadas e no encorajamento das iniciativas de auto-emprego, nas zonas urbanas e rurais, com enfoque para os jovens.

Também apelou à necessidade de se reduzir o “preço do dinheiro”, baixando a taxa de juros, que constitui ainda uma das grandes barreiras às iniciativas de investimento e, sobretudo, ao empreendedorismo dos jovens; para além da necessidade de se melhorar os critérios de redistribuição da renda.

“Trata-se de desafios que irão contribuir não só para manter a sustentabilidade do crescimento económico, como também dinamizar o desenvolvimento nas suas várias dimensões, elevando o número de cidadãos pertencentes à classe média, como sabem, um dos indicadores do grau de desenvolvimento dos países”, explicou a Presidente da AR.

Neste contexto, Verónica Macamo enfatizou o facto de se os moçambicanos quiserem romper com o ciclo da pobreza, não podem fazer parar o país no tempo.

“Temos de garantir a paz e mobilizarmo-nos para agirmos com firmeza no campo económico, desempenhando cada um de nós o seu papel da melhor maneira possível”, pediu.

DIÁLOGO É O INSTRUMENTO FUNDAMENTAL PARA A PAZ

A CHEFE da bancada parlamentar da Frelimo na Assembleia da República, Margarida Talapa, disse ontem que para o seu partido o diálogo é o instrumento fundamental para se cultivar os valores da cidadania, da convivência pacífica, de respeito pela diferença, solidariedade, civismo, ética social e aprofundamento da democracia.

Falando na cerimónia de abertura da II Sessão Ordinária do Parlamento, Talapa referiu que foi neste espírito que o Governo aceitou, há cerca de dois anos, o pedido da Renamo para dialogar em torno de matérias importantes para a vida do país.

“Em resultado disso, vários progressos aconteceram e queremos aqui e agora a todos recordar que foi feita a revisão do ‛pacote eleitoral’ para acomodar as exigências da Renamo de paridade nos órgãos eleitorais, a todos os níveis, incluindo na mesa de voto, como condição para participar nas eleições gerais de Outubro de 2014.

Segundo Talapa, isso resultou ainda no facto de o Parlamento ter aprovado a Lei da Amnistia, visando criar condições para a cessação das hostilidades militares protagonizadas pela Renamo, desde 2013; aprovou o Acordo de Cessação das Hostilidades Militares, de 5 de Setembro de 2014; aprovou o Estatuto do Líder do Segundo Partido Com Assento Parlamentar; e o Governo criou condições para o estabelecimento da equipa de observação da cessação das hostilidades militares – EMOCHM, para supervisar o processo de desarmamento e integração dos homens da Renamo nas Forças Armadas e na Polícia, e disponibilizou recursos necessários para o seu trabalho; para além de ter criado o Fundo da Paz e Reconciliação Nacional, oferecendo aos combatentes, incluindo os da Renamo, uma oportunidade para o seu enquadramento na produção e geração de renda para si e suas famílias.

“Tudo isto foi feito porque tanto o Governo como a bancada da Frelimo estavam convencidos de haver uma vontade genuína da Renamo de abandonar a via armada para participar no restabelecimento da paz efectiva”, referiu a chefe do grupo parlamentar da Frelimo.

Aquela responsável partidária acusou, por conseguinte, a “perdiz” de negar a letra e o espírito do Acordo de Cessação das Hostilidades Militares, demonstrando que é um grupelho organizado para semear o pânico e o terror.

“Reiteramos ser imperiosa a deposição das armas dos homens da Renamo que devem ser reintegrados nas suas comunidades e beneficiar das oportunidades que o Fundo da Paz e Reconciliação lhes abre. A esses compatriotas exortamos a seguirem o exemplo dos seus companheiros que já compreenderam ser esse o melhor caminho e, voluntariamente, decidem juntar-se aos demais moçambicanos e contribuírem para o desenvolvimento do país, através de trabalho digno e honesto”, salientou Talapa.

A chefe da bancada da Frelimo fez questão de considerar não ser justo o facto de alguns militantes da Renamo (particularmente os deputados e membros da direcção do ex-movimento rebelde) viverem no conforto e segurança das cidades, beneficiarem-se dos seus salários e outras regalias, usufruírem de água mineral, da energia eléctrica e do ar-condicionado, da oportunidade de enviar os seus filhos para as escolas e universidades, do direito de se expressarem, até para proferir ameaças e insultos à dignidade do Estado e das suas instituições, enquanto teimam em manter cativos e sem qualquer perspectiva de bem-estar compatriotas que poderiam estar a contribuir para o desenvolvimento do país, em cumprimento de uma agenda que nem sequer conhecem, porque estranha aos interesses dos moçambicanos.

“Os moçambicanos estão esperançosos que o sinal dado pelo líder da Renamo, entregando as armas que estavam na posse da sua guarda pessoal, seja o início do seu desarmamento e da sua efectiva transformação num verdadeiro partido político”, sublinhou para mais adiante apelar a todos ao moçambicanos para que lutem contra todas as manifestações de divisão da família moçambicana e para que se distanciem daqueles que procuram dividir o país recorrendo à força das armas ou outras formas subversivas.

AGP NÃO MORREU

O GRUPO parlamentar da Renamo considera que os entendimentos que põem termo à guerra e que devolvem a paz não podem ter um ciclo de vida limitado, daí que defende que o Acordo Geral de Paz (AGP), assinado em Roma entre o Governo e a “perdiz” a 4 de Outubro de 1992, não morreu.

Ivone Soares, líder deste grupo parlamentar, defende que para Moçambique o AGP significou uma entrada irreversível do multipartidarismo que devia permitir a realização de eleições livres, justas e transparentes e que culminaria com a alternância governativa.

“Dizer que este acordo acabou é deitar abaixo todas as conquistas havidas”, alegou Soares para depois sublinhar que o AGP cria a esperança de melhoria das condições de vida do povo.

Segundo ela, Moçambique estava expectante sobre o estabelecimento do Estado de Direito, das garantias e liberdades fundamentais e do funcionamento democrático das instituições numa clara demonstração de separação dos poderes. “Até aqui carregamos apenas esse sonho”.

“Ouvidos os discursos governamentais fica-se com a sessação de que tudo vai bem no nosso país. Se esses discursos oficiais reflectissem a realidade, Moçambique seria uma superpotência na região, no continente e no mundo e a nossa moeda seria das mais fortes”, referiu Ivone Soares. 

MDM REPUDIA USO DA FORÇA

A BANCADA parlamentar do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) diz que não acredita no uso da força para implantar a democracia no país, nem na violência para garantir a paz.

De acordo com o chefe deste grupo parlamentar, Lutero Simango, estas manobras perigam a construção de um Estado de direito democrático e visam ressuscitar a bipolarização política em Moçambique.

Falando na abertura dos trabalhos da II Sessão Ordinária da AR, Lutero Simango referiu ainda que o seu partido não se vai calar perante a tendência de os dois principais partidos nacionais – Frelimo e Renamo – usarem essas manobras para continuarem a defender os seus interesses.

“Vamos continuar a defender o país neste momento da sua história porque temos legitimidade democrática para o efeito, pois a opção pelo silêncio é covarde e imoral”, disse.

Segundo o deputado, é responsabilidade da menor bancada parlamentar mostrar ao mundo que a intervenção militar pode agravar a crise humanitária, provocando deslocados de guerra, milhares de crianças órfãs, crianças privadas de estudar e de assistência sanitária devido à fuga de professores e pessoal de saúde.

Neste sentido condenou, de viva voz, qualquer atitude de matar concidadãos nossos sejam eles políticos ou não; de agredir e ou violentar autoridades políticas ou civis. “Basta de usar os nossos jovens como comida para canhões, levando muitos a mortes ocultadas nas matas deste país. Essas matas não devem servir de túmulos, mas de locais de produção de comida para acabar com a malnutrição crónica a que estão sujeitas milhares de crianças. As nossas matas devem ser fontes de rendimento económico e oportunidade de emprego”, frisou Simango.

Aliás, para esta bancada a reconciliação nacional deve ser efectiva, de todos para todos; não se pode adiar o sonho da juventude e do país inteiro de viver numa nação coesa, livre do medo, da bajulação, do cinismo e da política dogmática.

A SESSÃO

A II Sessão Ordinária da Assembleia da República arrancou ontem, como é habitual nestas ocasiões, com pompa e circunstância.

O evento contou com a presença dos principais órgãos do Estado, com destaque para o Governo, representado pelo Primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, que se fazia acompanhar de diversos ministros e vice-ministros.

A cerimónia foi também testemunhada pelos presidentes do Tribunal Supremo, Adelino Muchanga; do Tribunal Administrativo, Machatine Munguambe; do Conselho Constitucional, Hermenegildo Gamito; para além da Procuradora-geral da República, Beatriz Buchili; presidente da CNE, Abdul Carimo Sau; e representantes do corpo diplomático acreditado no país, das confissões religiosas e de organizações da sociedade civil.

Esta sessão arranca com um rol de matérias de 23 pontos, onde se destacam o debate e aprovação do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado para 2016; o informe anual do Presidente da República sobre o Estado Geral da Nação, por sinal o primeiro a ser apresentado ao país pelo Presidente Filipe Nyusi; e a criação de uma comissão de inquérito para averiguar o badalado caso da criação e gestão da Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM).

A sessão contempla ainda o projecto de Revisão da Constituição da República, proposto pela bancada parlamentar da Renamo, que visa acomodar a pretensão desta força política de criar autarquias provinciais, iniciativa rejeitada pelo Parlamento na sua última sessão plenária devido à sua inconstitucionalidade.

Nesta sessão, a Assembleia da República vai, igualmente, debruçar-se sobre o projecto de Revisão do Código de Processo Penal, em seguimento da adopção, no ano passado, do novo Código Penal, já em vigor.

Também haverá momentos de interacção entre os deputados e algumas entidades nacionais, como é o caso do Governo, nas habituais sessões de Perguntas e de Informações; do Provedor de Justiça, que vai apresentar o seu Informe Anual.

No que concerne às propostas e projectos de lei, destaque vai para o projecto de criação da Ordem dos Enfermeiros de Moçambique; criação da Lei do Serviço Postal; e a Revisão da lei das Telecomunicações.